Que
relação existe entre a morte de uma mãe e o assassinato de um árabe? Essa é uma
das várias questões que surgem da leitura de O Estrangeiro, de Albert Camus; a
curta incursão de Mersault entre esses dois fatos e seu inusitado julgamento.
Esse
indivíduo de meia-idade nos é apresentado durante os acontecimentos que
envolvem a morte de sua mãe, que estava internada em um asilo, por escolha
mútua. Até aí, nada demais. O que intriga é sua recepção da notícia.
Certamente, ele não age de acordo com o estereótipo de um homem tomado pela
tristeza gerada pelo óbito de um ente querido. O primeiro trecho do livro
exemplifica bem: “Hoje, mamãe morreu. Ou ontem, não sei bem”.
Mas
o que acontece posteriormente também não é nada usual: quem pensaria em
assistir uma hilariante comédia no dia seguinte ao velório, em companhia de Marie,
sua pretendente? Não obstante, alguns dias depois, ele parte para um
maravilhoso passeio na praia, em companhia de seus amigos. Assim ele leva sua vida, sem deixar-se abalar por nada,
como um observador inócuo.
Porém,
as coisas começam a mudar com o fatídico assassinato. Se ao menos houvesse
motivo! A execução fria, impulsiva e desnecessária leva Mersault a ser detido,
o que lhe faz perder sua liberdade (e seus cigarros). Inicialmente, tudo corre
da melhor maneira possível, até que ele descobre que, os exagerados atenuantes
de seu crime, podem levar-no à forca.
Em
suma, o livro trata sobre a insólita vida de um homem, o estrangeiro de uma sociedade comum, que inspira marasmo e expira
indiferença. A sequência de fatos é transposta por passagens de apatia e
desinteresse que intrigam o leitor, cativando e fazendo-o querer conhecer o
desfecho que aguarda o protagonista; uma narrativa paradoxalmente interessante:
embora Mersault pareça ser um homem condenado pela vida e pela sociedade, há
uma luz ao fim do túnel para ele: em raros momentos, é possível notar seus
sentimentos aflorando; seja no desejo que sente por Marie, ou no desespero vívido
vivenciado por si na cadeia. Afinal, nosso estrangeiro adquiri o
sentimentalismo mundano (mesmo que debilmente), não diferente de outros
forasteiros, que aprendem a língua ou incorporam costumes de outro país.
Este
é o tipo de livro que, ora você recomendaria a todos, ora a ninguém. Camus
parece fazer isso propositalmente, com sua narrativa plana e que, apesar de
neutra, ora nos faz adorar Mersault, ora odiá-lo; um banquete para os
insensíveis.
Jeferson de Almeida
Administração SP
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